quinta-feira, 27 de março de 2008

A Paixão é Preto e Branca!!!

"CEM ANOS - O melhor lance do Atlético não foi num jogo.

Foi fora dele. Foi numa derrota.

Minto, num empate de um time invicto, o supervice-campeão do BR-77.

Não foi o melhor jogo ou jogada.

Mas não teve nada mais atleticano que aquilo: depois da derrota nos pênaltis para o São Paulo, Mineirão e Brasileirão estupefatos pela queda sem derrota de um senhor time de bola, os jogadores baqueados e barreados pela chuva e pela lama se abraçaram no gramado e assim foram ao vestiário.

Foi a primeira vez que vi a cena reverente que virou referência.

Ninguém estava fazendo marketing (nem existia a tal palavra).

Nenhum jogador estava jogando pra galera.

Era fato.

Time e torcida estavam juntos naquele abraço doído e doido.

Como tantas vezes o atleticano esteve junto com o time. Qualquer time.

Nada é mais atleticano que aquilo: um time que se comportou como o torcedor.

Solidário na dor, irmão no gol.

O atleticano é assim: tem a coragem do galo, mas não a crista.

Luta e vibra com raça e amor. Mas não se acha o dono do terreiro.

Sabe que precisa brigar contra quase tudo e contra quase todos. Até contra o vento, na célebre imagem de Roberto Drummond. Aquela que fala da camisa preta e branca pendurada num varal durante uma tempestade. Para o escritor atleticano, ou, melhor, para o atleticano escritor, o torcedor do Atlético sopraria e torceria contra o vento durante a tormenta.

Não é metáfora. É meta de quem muitas vezes fica de fora da festa. Não porque quer. Mas porque não querem. Posso falar como jornalista há 17 anos e torcedor não-atleticano há 41: não há grande equipe no país mais prejudicada pela arbitragem.

Os exemplos são tantos e estão guardados nos olhos e no fígado.

Não por acaso, o atleticano acaba perdendo alguns jogos e títulos ganhos porque acumulou nas veias as picadas do apito armado.

Algumas vezes, é fato, faltou time. Ou só sobrou raça. Mas não faltou aquilo que sobra no Mineirão, no Independência, onde o Galo for jogar: torcida.

Pode não ser a maior, pode não ser a melhor, pode até se perder e fazer perder por tamanha paixão, cobrando gols do camisa 9 como se todos fossem Reinaldo, pedindo técnica e armação no meio-campo como se todos fossem Cerezo, exigindo segurança e elegância da zaga como se todos fossem Luisinho.

Mas não se pode cobrar ninguém por amar incondicionalmente.

O atleticano não exige bola de todo o time. Não cobra inspiração de cada jogador. Quer apenas ver um atleticano transpirando em cada camisa, em cada posição, em cada jogada.

Por isso pede para que o time lute.

É o mínimo para quem dá o máximo na arquibancada.

A maior vitória atleticana é essa. Mais que o primeiro Brasileirão, em 1971, mais que o vice mais campeão da história do Brasil, em 1977. Os tantos títulos e troféus contam. Mas tamanha paixão, essa não se mede. Essa é desmedida. Essa é a essência atleticana.

Essa é centenária.

Essa é eterna."

Por Mauro Betting, em 25/03/08, no Yahoo Esportes:
http://br.esportes.yahoo.com/080325/50/gjlko1.html

Preciso falar mais alguma coisa???

quarta-feira, 26 de março de 2008

O Amor é Verde!

Dizem que a cor do amor é o vermelho, mas eu posso provar que é verde!

É bem possível que na primeira vez que consegui abrir meus olhos e ter algum contato visual com o mundo, agraciado pelo saudável e revigorante deleite do alimento no seio materno, me deparei com a grandiosa força de um par de olhos verdes que deixou gratas marcas por toda minha jornada de vida.

O olhar de mãe transmite um amor incondicional, cujas palavras não existem em grandeza para expressá-lo, e no meu caso, a simbologia mais próxima que encontrei para externar tal sentimento é que, para mim, o amor é verde!

Num simples olhar, o encontro à segurança, ao conforto, à paz, ao alimento, à energia e ao carinho. Nesse verde, o reconhecimento à existência, à construção orientada, responsável, bem conduzida, cuidadosamente assistida, desde os meus primeiros momentos de vida. E como se não bastasse, o tempo foi mostrando que, além do amor ser verde, também verdes se tornaram as minhas melhores referências.

Em minha história, é verde o exemplo de luta; de entrega a uma causa; de que o conhecimento é um alimento único e substancial; de que é sendo forte e determinado que se transforma o desejo em realização; de que na vida não existem sacrifícios, e sim investimentos; de que é possível ir até onde se quer chegar, bastando, para isso, querer...

E assim aprendi que se o verde brilha tanto diante de mim, deve ser gratificante ser um brilho assim. E não podia ser diferente, aprendi o que o verde me ensinou, ofereci o que entendi ser o melhor de mim, e, junto ao amor incondicional que recebi, transmiti, até geneticamente, o verde para minha filha. Minha princesinha, que me faz transbordar de tanto orgulho, por ver que muito do verde que aprendi, agora é também fonte saudável para o seu crescimento . Lá, nos olhos dela, disseminada geração após geração, novamente a prova de que o amor é verde.

E também verdes são os olhos de minha amada, meu aconchego, minha paz interior, meu eterno desejo e fonte de inspiração, minha companheira para toda a vida. Escolha aleatória? Coincidência? Claro que não, foi amor mesmo. É como disse, o amor é verde.

Olhando para trás, relatando minha história, sinto agora uma incontida gratidão que me toma por inteiro, que me faz, nestas poucas linhas, tentar traduzir e compartilhar o quanto seus princípios e valores nortearam minha vida, e graças ao seu verde sincero, posso ser um bom filho, um bom homem, um bom pai.

Obrigado, mãe! Você é a maior prova de que o amor é verde!

Parabéns pelo seu dia!

sábado, 15 de março de 2008

14 de março!!!

Em 14 de março, nasceram Albert Einstein, o poeta Castro Alves, a imperatriz brasileira Teresa Cristina Maria de Bourbon, o cineasta Glauber Rocha...
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Foi também em 14 de março, em 1840, que o papa Pio IX promulgou a constituição em Roma, mesmo dia em que o governo soviético, desta vez em 1918, se instalou no Kremlin em Moscou. Foi também o dia que Sérvia e Montenegro deixaram, em 2002, a Iugoslávia se tornar passado.
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No Japão, 14 de março é o dia dos namorados, na Irlanda, é o dia das sereias. No Brasil, comemora-se o dia nacional da poesia.
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Aqui, em meu coração, foi dia de festa, porque minha sogrinha fez aniversário. Com seus olhinhos doces e jeitinho tímido, esconde uma fortaleza de mulher disfarçada na fragilidade meiga que conforta e conquista aos que por sua vida passam. Ela me deu o presente da minha vida, trouxe ao mundo a minha melhor chance de amar alguém, e por tudo isso, não tenho palavras para agradecer. Este dia é muito especial para mim, graças a você!
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Izaura, te desejo toda a felicidade do mundo!
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Parabéns!!!

quinta-feira, 6 de março de 2008

Ser ou não ser, eis a questão!!! - Parte II

Para os apóstolos da infelicidade, aí vai uma boa justificativa. Para os avessos, um estímulo à superação!!!

Parece que a onda de agora vai ser apontar os níveis de reserva afetiva. Mais adiante, disponibilizar em cápsulas nas farmácias.
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Desculpa de infeliz, só o "extravio da receita"!

Felicidade pode ser herdada, diz estudo

Qui, 06 Mar, 03h53

LONDRES (Reuters) - Não se pode comprar a felicidade, mas parece que é possível pelo menos herdá-la, disseram pesquisadores britânicos e australianos na quinta-feira.

Um estudo com pelo menos 1.000 pares de gêmeos idênticos e não-idênticos descobriu que os genes controlam metade dos traços da personalidade que tornam uma pessoa feliz, enquanto fatores como relacionamentos, saúde e carreira são responsáveis pelo restante de nosso bem-estar.

"Descobrimos que cerca da metade das diferenças em relação à felicidade são genéticas", disse Tim Bates, pesquisador da Universidade de Edimburgo, que conduziu o estudo. "É realmente surpreendente."

Os pesquisadores fizeram aos voluntários, cuja idade variava de 25 a 75 anos, uma série de perguntas sobre sua personalidade, como quanto eles se preocupam e quão satisfeitos estão com suas vidas.

Como os gêmeos idênticos têm os mesmos genes (ao contrário dos gêmeos fraternos), os pesquisadores puderam identificar genes em comum que resultam em certos traços de personalidade e predispõem as pessoas à felicidade.

Pessoas sociáveis, ativas, estáveis, trabalhadoras e cuidadosas tendem a ser mais felizes, relataram os pesquisadores na revista Psychological Science. "O que o estudo mostra é que gêmeos idênticos têm personalidade e (conceito de) bem-estar muito similares. Por outro lado, tais semelhanças entre os gêmeos fraternos caem aproximadamente pela metade", disse Bates. "Isso implica fortemente em genes."

Os resultados representam uma importante peça no quebra-cabeça para os pesquisadores que estejam tentando entender melhor a depressão e o que faz diferentes pessoas felizes ou infelizes, disse Bates.

As pessoas que herdam uma personalidade mais positiva podem, conseqüentemente, ter uma reserva de felicidade para usar nas horas de estresse, acrescentou o pesquisador.

"Uma conclusão importante é que certos traços de personalidade, como ser extrovertido, calmo e confiável, dotam a pessoa de um recurso, uma 'reserva afetiva', que leva à felicidade futura", disse Bates.

(Reportagem de Michael Kahn)

quarta-feira, 5 de março de 2008

Ser ou não ser, eis a questão!!!

Tem gente que acredita no destino. Outros acreditam que o destino é o próprio sujeito quem constrói. Eu aprendi a ser um destes. Com muito custo, muito empenho e muita luta, mas a sensação de liberdade é algo indescritível. O mundo se colore, os horizontes se tornam mais amplos, a vida fica mais leve, e quando a gente não consegue enxergar onde quer, arranca lá de dentro um estímulo tão intenso e gratificante que qualquer objetivo se torna facilmente alcançável.

A impressão que tenho é que a distinção entre um sujeito ser feliz ou infeliz não está no mundo em sua volta, mas no desejo e no empenho dedicados por ele a esta questão. É simplesmente uma questão de foco, afinal, toda moeda sempre tem dois lados:

“Quero ser feliz!” Então me apego ao que me conforta e me satisfaz;

“Quero uma droga de vida!” Basta cavar em cada pedacinho da vida um motivo para justificar minha escolha.

Qualquer que seja o caminho, motivos sempre existirão. O curioso é que para o sujeito, parece que sempre há uma realização. A cada resposta que se desenterra do mundo há no fundo aquela confirmação do tipo “não falei que eu era infeliz? Eu estava certo!!!” Neste “mundo cruel”, o infeliz e bonzinho sujeito comemora o resultado de qualquer forma...

O agravante é que no entroncamento entre os fins e os meios fica evidente uma inversão de valores e o que supostamente era efeito desapercebidamente acaba se tornando causa. E assim está formado um ciclo vicioso.

Se a sua escolha já foi feita e você deseja mudar seu destino, trocar o "vicioso pelo virtuoso", basta olhar para o outro lado da moeda! Vai perceber que o mundo é um monte de recursos à disposição e que a forma de utilizá-los pertence somente a você. Brindar à felicidade construída com as próprias mãos tem um sabor muito mais especial que comemorar o encontro às justificativas para um mundo de infelicidade.

Experimente!!!

terça-feira, 18 de dezembro de 2007

Até debaixo d'água...

Alguns momentos são tão especiais que não se expressam com palavras! Mas são guardados junto a todos os outros em nossas mentes. A receita completa, os ingredientes de origem interna e externa, tais como os sentimentos, as imagens, os cheiros, os sons, as sensações, as vibrações e as associações, todos misturados ao conjunto de experiências que acumulamos em vida, vão formando a todo instante uma nova receita, única e exclusiva, o que cada um de nós se torna. E essa gaveta das recordações vive aberta, transbordando, turbulenta, deixando à mostra as lembranças e as referências, com a heterogeneidade que o caminho da vida nos impõe.

Certamente vivemos muitos momentos especiais ultimamente que tornaram nossas receitas mais saborosas. O olhos nos olhos, livre, transparente e inteiro; a sintonia que se impõe até mesmo nas divergências; o respeito ao desrespeito às diferenças; o companheirismo por puro desejo e sobretudo o compromisso mútuo com o desejo de cada um...

Quem consegue experimentar o gosto único de um simples caminhar de mãos dadas com a mulher amada, quem vê o coração bater mais forte porque sente o amor no olhar de quem se ama, quem se completa com o sorriso sincero da companheira, quem se conforta e se fortalece com seu abraço, quem divide o sofrimento das dores com a mesma disposição que compartilha os sucessos, pode finalmente transmitir ao mundo que a vida vale muito à pena, que ao resultado de uma busca determinada e obstinada, o mais provável é o encontro. E é nesse encontro que se desencontram as palavras, no abismo que separa a plenitude do sentimento da limitação da expressão.

É Como Dizia o Poeta:

"Quem já passou por essa vida e não viveu
Pode ser mais mas sabe menos do que eu
Porque a vida só se dá prá quem se deu
Prá quem amou, prá quem chorou, prá quem sofreu,

Quem nunca curtiu uma paixão,
Nunca vai ter nada, não

Ai de quem não rasga o coração,
Esse não vai ter perdão."


E Maceió, linda e aconchegante, cujas verdes águas de seu mar lembram os olhos de minha bela esposa, foi o fundo musical perfeito.


quarta-feira, 21 de novembro de 2007

Os frutos e as sementes – Rodrigo Palhares

Nascido em berço humilde, Ademar dividiu o colo da mãe, Dona Matilde, com outros nove irmãos. Eram tantos filhos que Dona Matilde dedicou todas as suas energias ao lar. Estudo praticamente nenhum, aprendeu foi com a vida mesmo. A herança que teve dos pais foi a tradição de que a família era seu maior tesouro e fez dessa fortuna a sua filosofia de vida. Ao seu lado, Seu Pedro, um homem franzino, de semblante firme e de poucas palavras, mas muito bem escolhidas. Certa vez, um de seus filhos reclamava muito da vida e Seu Pedro lá, calado, se esquivava das lamúrias. Era o emprego ruim, o salário baixo, a violência, a miséria, a comida, o tempo, enfim, tudo desagradava. Contava um caso de um colega que foi assaltado, lembrava do motorista do ônibus que dava arranques na direção, falava dos latidos do cachorro do vizinho no meio da noite, e assim ia se afogando nas queixas. E Seu Pedro lá, quietinho, enrolando seu cigarro de palha, num de seus raros momentos de descanso. Mas veio a deixa e seu sossego foi interrompido por uma pergunta:

- Essa vida é difícil demais, não é Pai?

Os dedos calejados do Seu Pedro pararam de trabalhar no fumo. Com firmeza, fisgou o filho com os olhos. Por alguns segundos, todos na casa se calaram. Parecia que o mundo tinha parado para finalmente Seu Pedro se pronunciar. Este era um daqueles momentos em que um segundo durava uma eternidade. Seu olhar por si só já dizia tudo, talvez nem fossem necessárias palavras, mas a provocação foi tamanha que Seu Pedro não parou no caminho, falou baixo mas em tom de sabedoria:

- A vida só é difícil para os fracos...

E assim, cada um ao seu jeito, Dona Matilde e Seu Pedro foram batalhando e construindo a história, disseminando seus valores a cada gesto.

Ademar, desde pequeno era um garoto observador. Inteligente e astuto, tinha o sangue quente correndo nas veias. Questionava com veemência as diferenças e as injustiças. Vivia dizendo que ia ser rico, que ia ganhar muito dinheiro e ter tudo que quisesse. Via os meninos ricos com roupas bacanas, observava os carros, as casas, os bens, o dinheiro... Via longe, e doía, olhava por perto, e sofria. Foi prestando atenção à sua volta, viu os cabelos do Seu Pedro ficarem brancos, acompanhou Dona Matilde caminhar com dificuldade para subir o morro. De repente ela mal dava conta de esticar o lençol no varal. A cabeça foi ficando ruim, foi esquecendo dos nomes, das coisas, das tarefas... E chegou o dia em que ela nem lembrava mais quem era ela, muito menos quem era Ademar. Em pouco tempo não se levantou mais da cama. Ademar também chorou a morte de seu irmão caçula que não teve atendimento médico, testemunhou sua irmã casar com um vagabundo e aparecer algumas vezes aos prantos em casa no meio da noite, exibindo as marcas da correia do marido. Foi confrontando as desgraças ao seu lado com a atrativa e cobiçada beleza da riqueza que estava fora do seu alcance. E foi ficando grilado, aturdido, alimentando um sentimento de revolta, tentando encontrar uma forma de mudar tudo aquilo.

Era um dia atrás do outro e não havia o menor prenuncio de uma vida melhor. Com uma bomba atrás da outra, veio a gota d’água. Seu Pedro fora mandado embora do trabalho. Já não agüentava o tranco da obra, já não tinha mais forças para competir com o vigor dos mais novos. Em casa, um mês depois, desesperado e nervoso, cansado de procurar trabalho, Ademar presenciou a única queixa de Seu Pedro durante toda sua vida. Foi uma forte dor no peito, Seu Pedro tentou segurar o grito, escolher as palavras, mas era tarde demais, não foi capaz de controlar. Se curvou aos poucos, tentou se apoiar no encosto da cadeira e, caindo lentamente, foi se ajeitando pelo chão, no centro da sala, bem onde seu corpo seria velado algumas horas mais tarde.

Lá estavam todos reunidos, menos Dona Matilde. Ficava no quarto, deitada, morta-viva. Ademar ia de um lado para o outro, ouvia os pingos da chuva nas telhas, escutava seus próprios passos, os choros, os lamentos... A casa estava cinza, o céu carregado. Não havia mais a fumaça do cigarro de palha do pai, apenas sentia o cheiro mórbido das rosas... Estava acuado, caminhava para um lado e esbarrava no que restara do pai, se virava e avistava no leito a mãe. No fundo se sentia testemunhando a própria morte, cruel, dolorosa e lenta. O que estava acontecendo? Onde estava aquele olhar da autoridade? Precisava agora daquelas poucas palavras que tocavam fundo em sua alma e alinhavam sua mente. Por onde andava o disputado colo de Dona Matilde? Não havia mais o beijo de boa noite, a mesa posta no café da manhã, a marmita cuidadosamente preparada para cultivar a lembrança do lar e da família no corrido intervalo do batente. Era um turbilhão de ausências que angustiavam Ademar. Ele, que achava que não tinha nada, que sofria porque queria ter dinheiro, morar numa casa grande e ser patrão, via os esforços de Seu Pedro e Dona Matilde irem por terra. De que adiantava tudo aquilo se quanto mais lutavam, menos tinham?

A vida deu forças para Ademar correr atrás do dinheiro. Não queria mais sentir tanta dor, não estava disposto se apegar a mais ninguém. Determinado, foi vendendo cada segundo de seu tempo, andava cinco quilômetros a pé para ir para o trabalho e economizar a passagem, comia pouco, não saia, não fazia nada além de trabalhar. Perdeu o casamento do irmão, o batizado dos sobrinhos, se ausentou nas festas de natal porque fazia um bico de porteiro naquelas horas em que ninguém se dispunha a executar tais serviços. E sozinho foi caminhando. Foi promovido, mudou de emprego, passou a ganhar bem. Comprou um terreno, construiu sua casa, aprendeu a dirigir para guiar seu carro novo. E foi guardando dinheiro. Quanto mais tinha, mais queria. Já conhecia bem os investimentos, ficou interessado, estudou a fundo o assunto, afinal, a grana já era muita e ele, mais que qualquer pessoa, sabia o preço que estava pagando, os riscos que estava correndo.

Um dia sua irmã ficou sozinha, o marido havia sido preso. Sem emprego, sem dinheiro e com quatro filhos pequenos, se ajoelhou aos seus pés para tentar suprir a fome dos meninos. Outro irmão ficou inválido num acidente doméstico, caiu do telhado quando reformava o barraco. Sem recurso e precisando de remédios, também se curvou diante de Ademar. E tantos outros que cresceram juntos, que viveram a infância de braços dados imploraram por ajuda e convidaram Ademar a participar novamente de suas vidas.

Uma antiga paixão da adolescência, a vizinha Rosa, por sorte ou por azar, acabou reencontrando Ademar. Conversaram, trocaram alguns carinhos, andaram de mãos dadas, relembraram as brincadeiras dos velhos tempos. O coração de Ademar balançou. Palpitava a ponto dele sentir escapar por entre os dedos todos os planos que por anos o mantiveram firme. Rosa custava muito caro, o deixava despido diante de si mesmo, o tornava vulnerável, frágil, dependente...

Foi difícil, mas Ademar enterrou sua paixão junto com boa parte de sua história. E foi em frente, contando dinheiro, acumulando riqueza. Agora ele podia viajar, podia ter o que quisesse, mas Ademar não queria gastar sua fortuna. Estava envolvido com tanto trabalho, guardando tudo que podia. Foram anos e anos de empenho, recebendo medalhas e honrarias pela dedicação à empresa, vendo as atendentes do banco sorrirem, limpando os pés no tapete vermelho que as sanguessugas esticavam para sua carteira.

O tempo passava muito rápido e de repente lá estava Ademar fazendo sessenta anos. Não viu sua barriga crescer, os cabelos branquearem, a pele enrugar. A voz já não era a mesma, os óculos se tornaram acessório indispensável. O cansaço estava vindo cada dia um pouco mais cedo, mais forte e intenso. Sua data fora brindada com uma bela tarde de sol. Era primavera, as ruas estavam cheias, coloridas, e Ademar finalmente se rendeu ao cansaço. Quis ver o mundo. Desceu do escritório e se pôs a caminhar calmamente pela praça, provavelmente fazendo um balanço de sua vida, como sempre fazia com suas finanças. Sentou-se em um banco e pôs-se a observar as pessoas. No banco ao lado um casal de namorados se abraçava. Sorriam, trocavam carícias, se beijavam... Mais adiante uma criança exibia, equilibrada em um par de patins, seus movimentos para seu pai. De longe era perceptível o orgulho que transbordava dele a cada manobra da menina. Ao fundo, um casal com três crianças jogavam comida para os patos. Perto deles, um carrinho de algodão doce perfumava a praça e arrancava dinheiro dos pais e brilho dos olhos dos filhos. Para todos os lados que Ademar olhava, as pessoas sorriam. Uns conversavam, outros brincavam, alguns se olhavam ou não faziam nada, mas todos pareciam felizes.

Um mal estar começou a tomar conta de Ademar. Não era bem o resultado que ele esperava encontrar em seu balanço. Queria se ver longe dali, voltar para o escritório, reencontrar a pilha de papéis que tinha deixado sobre sua mesa. Levantou rapidamente, tão ligeiro que ao começar a caminhar esbarrou num casal de velhinhos que por ali passeava, derrubando um pacote que estava na mão da senhora. Abaixou-se rapidamente, assustado e sem graça, para recolher os pertences da velhinha que se espalharam pelo chão. Tudo recolhido, Ademar finalmente se levantou e olhou nos olhos da senhora. Era Rosa, se desenterrando abruptamente de dentro de seu peito, em plena praça, de mãos dadas com o marido, passeando com os netos. E sorrindo!

O som das crianças brincando, do vento sob as árvores, dos carros na avenida, todos desapareceram diante daquele olhar. Ademar agora escutava o passado, ouvia os passos de Rosa indo embora e lembrava dos seus, de um lado para o outro na sala de sua casa. Ouvia os pingos da chuva no telhado, sentia novamente o cheiro mórbido das rosas... Tudo cinza, nebuloso, e lá estavam eles, Seu Pedro e Dona Matilde, no sacrifício de todos os dias, de mãos dadas. E Ademar ali, sozinho, perdido, perambulando pela praça, sem frutos para colher porque se alimentou das sementes.

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Por que um blog? - Rodrigo Palhares

Plagiando os ditos da minha avó, eu andava mesmo procurando uma “sarna para coçar”. A vontade de escrever era antiga, sempre carreguei comigo o desejo de publicar alguma coisa, e até onde me dispus a me analisar, expressar desta forma sempre me agradou mais.

Não sou dessa geração que nasceu com um ipod num bolso e um notebook debaixo do braço, mas dou meus pulinhos, aprendo até rápido sobre os benefícios que a tecnologia proporciona. E parece que esse negócio de blog está querendo me contaminar também. Uniu o “útero ao agradável”! Não tenho o que escrever, mas quero escrever! Não é essa a razão da existência de um blog? Na era da individualidade e do egoísmo, alguém teve a brilhante idéia de abrir um espaço para documentar coisas que só o próprio autor perderia seu tempo lendo. Então estou entrando no clima, me auto-denominando blogueiro, iniciando a representação de um monólogo para um leitor só, que aprende e apreende em seu solitário desabafo, expresso pelas vozes de um teclado.

Então é isso, Petitesse vai reunir com brevidade um bocado de falta de assunto para todos, mas contemplará o que me der na telha escrever. Um pouquinho de tudo que ajudar a alimentar o meu ego, por mais idiota que essa idéia possa parecer, vai se aglutinar nesse endereço.

De qualquer forma, seja bem vindo!